A investigação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o caso da compra da GVT pela Vivendi identificou que, depois de ter comprado 4,9% das ações da empresa brasileira na bolsa, a companhia francesa teria continuado a fazer aquisições de derivativos para elevar sua exposição à companhia brasileira sem comunicar as compras ao mercado.
Conforme a Instrução nº 358 da CVM, quando um investidor ultrapassa o limite de 5% das ações de uma empresa, ele precisa divulgar essa informação publicamente, embora não esteja dito expressamente que esse cálculo deve considerar derivativos lastreados em ações.
Em acordo firmado ontem, a Vivendi aceitou pagar R$ 150 milhões à CVM para encerrar o processo em que era acusada, entre outras coisas, de operação fraudulenta e de uso de informação privilegiada na transação de compra da GVT no fim de 2009.
Esse é, de longe, o acordo de maior valor já firmado pela autarquia com um acusado, equivalendo a três vezes o montante de R$ 47 milhões de todos os termos de compromisso assinados pela CVM no ano passado inteiro.
O segundo maior termo de compromisso foi firmado com o Safra, em 2007, no valor de R$ 29,5 milhões, sendo que a maior parte era para ressarcimento de cotistas de fundos da instituição. O terceiro mais relevante, cujos recursos foram apenas para a autarquia, foi firmado com o banco Credit Suisse, em 2009, em uma acusação de uso de informação privilegiada com ações da fabricante de aviões Embraer. O valor pago foi de R$ 19,2 milhões.
Segundo a apuração da autarquia, a Vivendi comprou derivativos, chamados de "total return swaps", do banco japonês Nomura, por meio do banco Rothschild. Para lastrear para os contratos, o Nomura comprou os papéis da GVT no mercado local e chegou até a anunciar sua posição publicamente.
No mesmo dia em que anunciou ter atingido participação de 57,5% das ações da GVT, a Vivendi teria transferido esses "swaps", equivalentes a 9,7% do capital, para o fundo Tyrus Capital (que também é alvo de processo e não propôs acordo), e ficado com uma opção de compra desses instrumentos, que tinham previsão de liquidação exclusivamente financeira. Por sua própria conta, o Tyrus já havia comprado uma parcela relevante de "swaps" lastreados em ações da GVT, esses sim, a essa altura, já com opção de liquidação física.
O inquérito informa que um dia antes o Tyrus havia consultado a Nomura sobre a opção de retificar os "swaps", para que eles previssem a liquidação física, mas por algum motivo isso não foi feito.
No dia 13 de novembro do ano passado, então, a Vivendi comprou mais ações diretamente no mercado (além da posição de 4,9% que já detinha), firmou acordo de opção de compra de 19,4% referente aos derivativos que estavam com o Tyrus, e ficou com a fatia de 30% do capital dos antigos controladores.
No comunicado ao mercado divulgado no mesmo dia, a Vivendi informou que tinha alcançado uma fatia de 57,5% do capital, o que foi entendido pelo mercado como um fracasso antecipado da oferta pública que havia sido lançada pela Telefónica, que estava agendada para o dia 19.
Se a companhia francesa tivesse comprado de 20% a 30% do capital da GVT em um mesmo dia no mercado, de grandes acionistas, em operações fechadas fora da bolsa, como era a suspeita inicial, a Vivendi teria infringido outra regra da CVM, que seria uma oferta pública de aquisição de ações sem registro.
Por conta de ter supostamente induzido o mercado a erro, a CVM acusou a Vivendi de operação fraudulenta. Ao continuar comprando ações no mercado, enquanto não havia divulgado que parte dos derivativos que possuía não previam liquidação física, a autarquia considera que houve negociação com uso de informação privilegiada.
Apesar de as acusações serem relevantes, o Valor apurou que havia o entendimento de que, num julgamento, a multa a ser imposta à Vivendi não poderia ser da ordem de alguns bilhões, por ser metade do valor da aquisição, que totalizou R$ 7,5 bilhões. Isso porque não é possível enquadrar todas as compras de participação como irregulares.
Em comunicado, a Vivendi fez questão de ressaltar que a assinatura do acordo "não implica em confissão ou reconhecimento de culpa". Questionado sobre a decisão de pagar R$ 150 milhões mesmo se considerando inocente, Simon Gillham, vice-presidente executivo de comunicação da Vivendi disse, por telefone, que a intenção era deixar essa investigação para trás, e se focar em 2011 apenas no crescimento da GVT.
Ele disse ainda que a empresa está segura de que em todos os momentos seguiu a legislação brasileira, mas se negou a explicar detalhes do termo de acusação. Lembrou apenas que a Telefónica havia dito, em comunicado oficial, que não chegaria ao preço de R$ 56 por ação pago pela Vivendi.
Fonte: Valor Online - 11.11.2010
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