terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Posição da Comissão de valores sobre coisa julgada em matéria tributária

 A CVM divulgou no dia 13 de fevereiro o Ofício-Circular que trata da decisão tomada pelo STF sobre  coisa julgada em matéria tributária.


OFÍCIO-CIRCULAR Nº 1/2023/CVM/SNC/SEP

                                                                                                       Rio de Janeiro, 13 de fevereiro de 2023.

Assunto: Orientações quanto a aspectos relevantes a serem observados quando da elaboração e publicação das Demonstrações Contábeis para o exercício social encerrado em 31.12.2022, em face de decisão do STF sobre coisa julgada em matéria tributária.

Senhor Diretor de Relações com Investidores e Senhor Auditor Independente,

Os Ofícios Circulares emitidos em conjunto pela Superintendência de Normas Contábeis e de Auditoria - SNC e pela Superintendência de Relações com Empresas – SEP, visam a orientar a elaboração das demonstrações contábeis e têm sido considerados um instrumento eficaz pelas áreas técnicas da CVM para salvaguardar a qualidade das informações disseminadas no mercado.

Neste sentido, considerando a decisão tomada na última quarta-feira, dia 08.02.2023, pelo Plenário do STF, amplamente veiculada[1], as áreas técnicas da CVM julgam ser de extrema relevância alertar os Diretores de Relações com Investidores das companhias abertas e seus auditores com relação a dispositivos normativos que devem ser observados, quando da elaboração de suas demonstrações contábeis de 31.12.2022, ou quando da reapresentação espontânea, caso já tenham sido divulgadas ao mercado.

A título de informação, e para que não paire qualquer dúvida quanto aos impactos e alcance da decisão do STF sobre as demonstrações contábeis de
31.12.2022, convém reproduzir algumas passagens de veiculação feita no site da suprema corte[2]:

“Em decisão tomada na última quarta-feira (8),
por unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou que uma decisão definitiva, a chamada “coisa julgada”, sobre tributos recolhidos de forma continuada, perde seus efeitos caso a Corte se pronuncie em sentido contrário. Isso porque, de acordo com a legislação e a jurisprudência, uma decisão, mesmo transitada em julgado, produz os seus efeitos enquanto perdurar o quadro fático e jurídico que a justificou. Havendo alteração, os efeitos da decisão anterior podem deixar de se produzir.

(...)

Sobre quais tipos de tributos o STF se pronunciou?

A decisão que estipulou a perda de efeitos de uma sentença definitiva (transitada em julgado, sem possibilidade de recurso), caso o Supremo tome uma decisão contrária, foi unânime e vale apenas para tributos recolhidos de forma continuada, ou seja, aqueles cuja cobrança se renova periodicamente, como a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Nos casos dos tributos cobrados uma vez só, como, por exemplo, o ITBI, que incide sobre a venda de um determinado imóvel, se houver uma decisão transitada em julgado, como a relação é única, esse direito permanece, mesmo após decisão contrária do STF sobre o tema.

(...)

Por que o STF reverteu nesses casos a “coisa julgada”?

O ministro salientou que a coisa julgada – o direito adquirido a partir de uma decisão judicial sem possibilidade de recursos – vale enquanto permanecerem as mesmas condições fáticas e jurídicas. No entanto, quando a Suprema Corte decide que um tributo é devido, a partir daquele momento, todos têm que pagar.

Barroso destacou a importância de que um determinado tributo incida sobre todos os atores do mercado, caso contrário, quem tiver obtido uma coisa julgada antiga tem uma vantagem competitiva em relação aos concorrentes, em decorrência da desigualdade tributária.

(...)

Haverá prejuízo às empresas envolvidas?

Conforme o ministro Barroso, desde que o STF tomou a decisão em 2007, nenhuma empresa pode dizer que foi pega de surpresa. Para ele, o entendimento do STF não cria insegurança jurídica, pois quem deixou de pagar depois que a Corte validou a cobrança e não provisionou recursos para esta finalidade fez uma “aposta”.

(...)

O entendimento valerá para todos os processos?

A decisão foi tomada em sede de repercussão geral. Portanto, a decisão valerá para todos os casos semelhantes que corram em outras instâncias.

Nos casos de outros tributos que venham a ser considerados constitucionais, a partir de quando as empresas terão que pagar os valores?

Pelo entendimento dos ministros, se o tributo for imposto e considerado constitucional, ele só será cobrado no ano seguinte. Se for contribuição, três meses depois da decisão.

O ministro Barroso esclareceu ainda que no caso da CSLL, por ter uma inequívoca decisão anterior do Supremo afirmando que o tributo era devido, a Corte entendeu que não deveria fazer a chamada modulação e determinou o recolhimento dos valores passados, respeitado o prazo de prescrição. Caso haja outro tributo, em situação fática ou jurídica distinta, o STF poderá decidir se haverá ou não modulação.

(...)” (todos os grifos nossos)

Em decorrência da referida decisão do STF, as áreas técnicas entendem que,
sem prejuízo da aplicação da Resolução CVM n. 44, que deverá ser observada, deverão ser observados os pronunciamentos do CPC n. 24 e n. 25, quando da elaboração das Demonstrações Contábeis de 31.12.2022, em particular os dispositivos a seguir reproduzidos:

“CPC 24.9. A seguir são apresentados exemplos de eventos subsequentes ao período contábil a que se referem as demonstrações contábeis que exigem que a entidade ajuste os valores reconhecidos em suas demonstrações ou reconheça itens que não tenham sido previamente reconhecidos:

(a)
decisão ou pagamento em processo judicial após o final do período contábil a que se referem as demonstrações contábeis, confirmando que a entidade já tinha a obrigação presente ao final daquele período contábil. A entidade deve ajustar qualquer provisão relacionada ao processo anteriormente reconhecida de acordo com o CPC 25 – Provisões, Passivos Contingentes e Ativos Contingentes ou registrar nova provisão. A entidade não divulga meramente um passivo contingente porque a decisão proporciona provas adicionais que seriam consideradas de acordo com o item 16 do CPC 25; (...)” (grifo nosso)

“CPC 25.16. Em quase todos os casos será claro se um evento passado deu origem a uma obrigação presente. Em casos raros – como em um processo judicial, por exemplo –, pode-se discutir tanto se certos eventos ocorreram quanto se esses eventos resultaram em uma obrigação presente. Nesse caso, a entidade deve determinar se a obrigação presente existe na data do balanço ao considerar toda a evidência disponível incluindo, por exemplo, a opinião de peritos.
A evidência considerada inclui qualquer evidência adicional proporcionada por eventos após a data do balanço. Com base em tal evidência:

(a) quando for mais provável que sim do que não que existe uma obrigação presente na data do balanço, a entidade deve reconhecer a provisão (se os critérios de reconhecimento forem satisfeitos); e

(b) quando for mais provável que não existe uma obrigação presente na data do balanço, a entidade divulga um passivo contingente, a menos que seja remota a possibilidade de uma saída de recursos que incorporam benefícios econômicos (ver item 86)” (grifo nosso)

Por fim, é entendimento das áreas técnicas que se faz necessária uma robusta divulgação do evento aqui tratado quanto a seu impacto nas demonstrações financeiras e na destinação do resultado do período.

                                                           Atenciosamente,

                     Original assinado por                                                                                                           Original assinado por
          OSVALDO ZANETTI FAVERO JUNIOR                                                                                  FERNANDO SOARES VIEIRA                                                                                          
           Superintendente de Normas Contábeis e de Auditoria em Exercício                             Superintendente de Relações com Empresas