ESTADÃO 24/01/2001
Leandro Modé
Expectativa é de que número de empresas que abrirão capital na Bolsa supere largamente o do ano passado
O volume atípico de trabalho para esta época do ano obrigou o executivo Paulo Sergio Dortas a criar uma rotina incomum para quem está de férias. Durante as manhãs e em boa parte das tardes, passeios de barco pelo belo litoral baiano. Ao cair da noite, horas sentado em frente do computador. Dortas é sócio da consultoria Ernst & Young na área de abertura de capital de empresas, operação conhecida pela sigla em inglês IPO.
"O ano está começando aquecido", afirma. "O Brasil certamente continuará a ser um dos principais mercados para IPOs em 2010." No ano passado, o País realizou o maior IPO do mundo ? o do banco Santander, que levantou US$ 7,5 bilhões ? e ocupou a terceira posição do ranking global desse tipo de operação, atrás apenas de China e Estados Unidos.
O desempenho pode ser explicado pelas virtudes do Brasil e pela paradeira lá fora, fruto, claro, da crise econômica global. No total, o País teve seis operações, que levantaram US$ 13,2 bilhões. São números bem mais modestos que os de 2007, quando os IPOs bateram todos os recordes aqui, com 68 operações e volume financeiro de US$ 37,4 bilhões.
Para este ano, nenhum executivo se arrisca a fazer projeções. Mas é certo que a quantidade de operações superará de longe a meia dúzia do ano passado. Em termos de volume financeiro, é difícil estimar, porque 2009 teve duas transações de um porte pouco usual: além de Santander, a da Visanet, que obteve US$ 4,3 bilhões.
Até agora, cinco empresas deram entrada com a documentação necessária para um IPO na Comissão de Valores Mobiliários (CVM): BR Properties, que atua no setor imobiliário, Multiplus, subsidiária da TAM no segmento de fidelização de clientes, Aliansce Shopping Centers, Renova Energia, que atua no segmento de energia renovável, e a International Meal Company (IMC), dona de marcas como Viena, Frango Assado e Brunella. "Mas vem mais por aí", avisa Dortas.
Quem vai debutar no mercado em 2010 será a Aliansce, que apresentou há dez dias os detalhes da operação. O período de reserva para investidores termina na próxima quarta-feira. Estima-se que o negócio possa movimentar pouco mais de R$ 1 bilhão. A Multiplus também está com o processo em fase adiantada, e pretende iniciar a negociação de seus papéis na Bovespa no dia 5 de fevereiro.
A IMC tentou fazer o IPO no ano passado, mas desistiu em meados de dezembro sob a justificativa de que o momento não era favorável. Essas cinco operações, segundo estimativas do mercado, podem movimentar cerca de R$ 5 bilhões.
"Antes da crise financeira internacional iniciada em 2008, havia aproximadamente 45 empresas com processos de abertura de capital registrados na CVM. Considerando que apenas 6 fizeram IPOs no ano passado, acreditamos no grande potencial para listagem de novas empresas durante 2010, principalmente de companhias do setor de varejo", afirmou ao Estado o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto.
Tamanha movimentação cria terreno fértil para especulações. No mercado, uma das companhias citadas como candidata a fazer um IPO em 2010 é O Boticário. Procurada pela reportagem, a empresa informou, por meio da assessoria de imprensa, que "não tem planos para abrir o capital". Fala-se também que multinacionais podem seguir o exemplo do Santander e captar dinheiro no Brasil para financiar a expansão de seus negócios no País. Nesse contexto, são citadas companhias de varejo, de alimentos e até do setor automobilístico.
O pano de fundo para as expectativas positivas do mercado com os IPOs é o mesmo do segundo semestre do ano passado. "Claramente, o Brasil tem a melhor relação risco-retorno (do mundo) no pós-crise", define o vice presidente executivo de corporate e investment banking do Santander, João Roberto Teixeira. "As perspectivas para o Brasil são excelentes, graças ao tamanho da economia, à estabilidade política e econômica e ao potencial de crescimento", completa o diretor do banco de investimentos do Credit Suisse no País, José Olympio Pereira.
Nesse contexto, os setores que os especialistas identificam como de maior potencial são varejo/consumo (por causa do mercado interno forte), financeiro (expansão do crédito a pessoas físicas e empresas), infraestrutura (Copa do Mundo de 2014, Olimpíada de 2016 e exploração do pré-sal), imobiliário (programa Minha Casa, Minha Vida e alta do crédito ao setor) e óleo e gás (pré-sal).
Outra característica apontada pelos profissionais da área em 2010 é a seletividade. "O mercado não será como em 2007, o que é bom", diz Pereira. Isso não significa, aponta Fabio Mentone, diretor do Bradesco BBI, que só haja espaço para grandes empresas. "Existe mercado para boas histórias."
Responsável pela área de mercado de capitais do banco Morgan Stanley na América Latina, Paulo Mendes confirma. "Os investidores não estão receptivos a qualquer oferta", observa. "Há uma certa arte na forma de fazer isso. É preciso habilidade para acessar o mercado da forma apropriada."
O diretor da Caixa Geral de Depósitos (CGD) Diogo Castro e Silva lembra que, apesar do otimismo global com o Brasil, os investidores estão também muito exigentes. "Como o Brasil está no foco do mercado global, a expectativa com o País cresce. Com ela, aumenta a exigência", afirma.
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