quarta-feira, 17 de novembro de 2010

PanAmericano: Auditoria ignorou checagens básicas

Maior empresa do setor no mundo, Deloitte não conferia em que condições o banco tinhavendido carteiras de crédito. Prazo legal para o envio do demonstrativo financeiro do terceiro trimestre acabou à meia-noite de ontem.


A Deloitte mandou na última semana para o Banco PanAmericano e para o Banco Central o balanço do terceiro semestre da instituição financeira de Silvio Santos como se ela não tivesse um rombo de R$ 2,5 bilhões - R$ 2,1 bilhões são do banco e R$ 400 milhões da área de cartão de crédito.

O buraco seria tratado numa nota técnica da demonstração financeira, recurso usado normalmente para explicar metodologia ou eventos menores no período analisado pelo balanço - de junho a agosto deste ano.

Executivos que integram a nova diretoria e o novo conselho de administração do PanAmericano se recusaram a assinar o balanço porque seria o endosso da fraude, na interpretação deles. O prazo legal para o envio da demonstração financeira do terceiro trimestre acabou à meia-noite de ontem.

O buraco foi descoberto pela fiscalização do Banco Central em agosto, mas a Deloitte só ficou sabendo do problema no mesmo dia em que o PanAmericano fez um comunicado ao mercado - no último dia 7. A Deloitte é a maior empresa de auditoria do mundo e não apontou os problemas que o PanAmericano tinha ao auditar o balanço de 2009.

Entre outros problemas, diretores do PanAmericano vendiam carteiras de crédito para outros bancos, mas não registravam o repasse na contabilidade.

Com isso, a situação do banco parecia melhor do que era de fato.

PROCESSO

Silvio Santos já anunciou que vai processar a Deloitte por conta da aparente omissão na análise do balanço.

Se for condenada a pagar uma indenização para o empresário, uma das hipóteses mais plausíveis, a empresa de auditoria corre o risco de se tornar inviável no Brasil.

O PanAmericano recebeu um empréstimo de R$ 2,5 bilhões do Fundo Garantidor de Crédito, um instrumento criado justamente para salvar bancos que estejam correndo risco de quebrar.

A venda de carteiras de crédito para outros bancos, sem a devida baixa, não foi notada pela Deloitte porque a empresa deixou de fazer checagens primárias, segundo dois auditores ouvidos pela Folha. Um deles define o trabalho dos auditores como coisa de estagiário.

A Deloitte não conferia com outros bancos quais eram as condições em que o PanAmericano havia vendido carteiras de crédito.

A conferência desse tipo de venda é essencial para um balanço porque, conforme as condições de venda, afeta a capacidade do banco de emprestar dinheiro.

Era o que acontecia no PanAmericano. As carteiras de crédito eram vendidas com o que o mercado chama de coobrigação - o banco de Silvio Santos funcionava como uma espécie de avalista daquele crédito e pagaria pelos eventuais casos de calote.

Os executivos não registravam a venda nem a cláusula de coobrigação. Se a coobrigação fosse registrada, como manda a lei, o PanAmericano ficaria com menor capacidade de emprestar recursos e teria de diminuir o ritmo de captação de clientes.

O foco principal da instituição são os financiamentos de carros, motos e computadores.

OUTRO LADO

Deloitte diz que não enviou a demonstração

A Deloitte diz que não tem procedência a apuração da Folha de que a empresa enviou uma demonstração financeira na qual o buraco de R$ 2,5 bilhões aparece apenas numa nota técnica.

A reportagem pediu à empresa que fornecesse uma prova de que a informação era improcedente e obteve a seguinte resposta: não foi a Deloitte que finalizou a auditoria do terceiro trimestre.

Sobre a checagem da venda de crédito com coobrigação, a Deloitte diz que não pode informar o que fez durante a checagem do balanço porque há uma cláusula de confidencialidade que veta esse tipo de informação.


PERFIL

Empresa estava com o banco desde 2004

Responsável por conferir documentos e atestar informações contábeis, a Deloitte é a empresa que "assinava embaixo" de todos os balanços e demonstrações do PanAmericano desde 2004.

Se comprovadas as acusações, terá de responder financeiramente por parte das perdas, podendo ficar insolvente no país.

A empresa não tem seguro para cobrir eventuais erros e omissões da equipe. A unidade brasileira é franquia da britânica Deloitte, a maior empresa do mundo no ramo.

A crise pode levar ao descredenciamento da unidade brasileira pela matriz. No Brasil, a Deloitte tem cerca de 4.000 profissionais. No ano passado, faturou R$ 738 milhões - 40% em auditoria e 60% em consultoria, atividade que não tem risco financeiro.

Fonte: Folha de S. Paulo

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