quarta-feira, 17 de novembro de 2010

PanAmericano: Por que a Deloitte erra tanto

Fonte: Isto é Dinheiro - nov 2010 - Por Cláudio Gradilone

A empresa de auditoria do PanAmericano deixou escapar um rombo de R$ 2,5 bilhões. E foi apenas um entre vários erros da empresa.

O economista aposentado Enrique Garcia tomou um empréstimo consignado, garantido por sua aposentadoria, no Banco PanAmericano, que já foi pago. Pouco mais de um ano depois, o microempresário Fábio Casagrande financiou a compra de seu Ford Ka com a ajuda do banco.

Eles não se conhecem, mas têm uma coisa em comum: os pagamentos de Garcia foram usados para quitar as dívidas de Casagrande. Os empréstimos concedidos pelo PanAmericano eram empacotados em grandes carteiras, posteriormente vendidas várias vezes para bancos diferentes. O dinheiro dos novos créditos pagava os juros dos antigos.

O objetivo da fraude era engordar os ativos e os lucros do banco, e turbinar a remuneração dos executivos. Foi essa pirâmide financeira fraudulenta que gerou o rombo de R$ 2,5 bilhões no banco de Silvio Santos, em um processo construído pelo menos há quatro anos – e, por incrível que pareça, a Deloitte, responsável pela auditoria dos balanços, não enxergou nada.

“As auditorias, a interna e a externa, não perceberam o que estava acontecendo”, diz Celso Antunes da Costa, novo diretor-superintendente do Panamericano que tomou posse na terça-feira 9. Em teoria, as empresas de auditoria são pagas para garantir a confiabilidade das informações publicadas pelas empresas.

Na prática, a Deloitte chancelou o balanço do PanAmericano referente ao segundo semestre de 2010 sem ressalvas, o que certamente prejudicou clientes, aconistas e colocou em risco a própria economia. Como um rombo desse tamanho passou despercebido? “Pode ser que alguém do banco ou da auditoria tenha indicado que havia diferenças de valores, mas, se isso ocorreu, a apuração não avançou”, diz Costa, que já colocou na agenda a busca de outra auditoria. “Não há clima para continuarmos com a Deloitte.”

O erro de R$ 2,5 bilhões da auditoria no PanAmericano é mais uma derrapada em uma lista de casos parecidos. A Deloitte estava encarregada de auditar as contas da Parmalat, que quebrou em 2003 deixando um buraco de US$ 1,8 bilhão. Também era a responsável pelas contas da empresa de lentes de contato Bausch & Lomb, cujos executivos da subsidiária brasileira desviaram US$ 25 milhões (na época, a Deloitte negou que auditava as contas da empresa).

Mais recentemente, a Deloitte também olhava os números da Aracruz, empresa de celulose que perdeu R$ 1,95 bilhão em operações com derivativos cambiais em 2008. A Deloitte tinha de garantir que as informações prestadas pelo banco fossem consistentes, mas não foi a única empresa a esquadrinhar os números do PanAmericano.

A venda de 36% do seu capital total e 49,99% das suas ações ordinárias para a Caixa Econômica Federal teve a assessoria do banco Fator e da auditoria KPMG, que também não perceberam nada de errado nos números. Durante a negociação, o Fator encontrou divergências em dívidas trabalhistas e tributárias, que reduziram a avaliação do PanAmericano em R$ 100 milhões, mas essas diferenças são normais em vendas de empresas, diz Venilton Tadini, diretor de banco de investimentos do Fator.

Ele afirma que seria impossível encontrar o rombo nos ativos “Não tivemos acesso completo aos dados, não podíamos ver quem eram os compradores das carteiras de crédito.” O executivo diz que nem o Fator nem a KPMG puderam ir fundo na pesquisa. “Não fomos autorizados a consultar a Deloitte, pois o banco temia ter de divulgar ao mercado que estava procurando um sócio”, diz ele. “Se o negócio não fechasse, o PanAmericano quebrava, pois a confiança do mercado ficaria arranhada.”

Isso já ocorreu. A recepcionista Janaína dos Santos tomou um empréstimo no Panamericano há dois meses para financiar a compra de um carro. “Não dá para confiar em um banco que tem fraude”, diz. Procurada, a Deloitte divulgou uma nota em que diz ser “uma empresa presente no Brasil desde 1911, que atende a cinco mil clientes e com quatro mil profisionais pautados pela mais estrita ética, transparência e profissionalismo”. Ah, bom.


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