Processos abertos contra as empresas, pela CVM, devem analisar a contabilização do câmbio nos balanços, que evitou prejuízos
RIO - A adoção da
contabilidade de hedge (proteção) por companhias abertas para reduzir o impacto
da alta do dólar nos resultados do segundo trimestre está sendo apurada pela
Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O regulador pediu explicações para pelo menos
dois grupos: Petrobrás e Braskem.
Uma consulta a dados
públicos revela que a Superintendência de Relações com Empresas (SEP) da CVM
abriu processos administrativos para analisar as informações trimestrais dessas
companhias. O da estatal foi iniciado ontem, três dias após a publicação do balanço
financeiro do segundo trimestre.
Consultada, a CVM informou
que não comenta casos específicos. No entanto, confirmou que a SEP "está
analisando o referido tema contábil para um conjunto de companhias, no âmbito
do Sistema de Supervisão Baseada em Risco (SBR)".
A prática da contabilidade
de hedge é legal e autorizada no País desde 2009. A opção por esse modelo já
foi feita anteriormente por grandes companhias. A hipótese é que a CVM esteja
questionando o momento e a forma como as duas empresas comunicaram ao mercado a
nova política. Esse mecanismo neutraliza parte do impacto da variação sobre a
dívida da empresa no curto prazo.
Em entrevista coletiva
ontem, o diretor financeiro da Petrobrás, Almir Barbassa, afirmou que a
contabilidade de hedge "veio para ficar".
Para Barbassa, a
contabilidade de hedge é um instrumento muito útil para países em
desenvolvimento, que têm maior dificuldade de captar recursos no mercado
internacional "e acabam expostas a variações". Além disso, reduz a
volatilidade no resultado fruto de variações cambiais.
Repercussão. A decisão da Petrobrás teve
forte repercussão no mercado por ter sido tomada em meio à escalada do dólar.
No segundo trimestre do ano
passado, quando o dólar se valorizou 10,93%, a Petrobrás registrou prejuízo de
R$ 1,346 bilhão, o primeiro balanço no vermelho desde a maxidesvalorização do
real, em 1999.
Tanto a estatal quanto a
Braskem passaram a adotar a contabilidade de hedge em maio. No entanto, as
companhias só comunicaram a nova prática ao mercado em julho, quando os
balanços já estavam fechados.
É possível que a CVM também
olhe a maneira como o impacto dessa contabilidade foi destrinchada nos
balanços. Outro ponto é verificar se as companhias cumpriram o trâmite
necessário à adoção do hedge. Por exemplo, se há garantias de receita futura
compatível com a perda contábil referente ao efeito do câmbio sobre a dívida.
Na contabilidade de hedge
as exportações são usadas como proteção contra a variação da dívida em moeda
estrangeira. A manobra elimina o descasamento contábil entre os efeitos
benéficos da valorização do câmbio na receita de empresas exportadoras - mais
demorado - e o imediato peso negativo sobre a variação da dívida em moeda
estrangeira.
A decisão da Petrobrás de
adotar a mudança a partir de maio evitou um resultado trimestral fraco. O lucro
de R$ 6,201 bilhões reportado entre abril e junho foi alcançado porque um
montante de R$ 7,982 bilhões em perdas cambiais não foi contabilizado no
resultado, mas no patrimônio líquido da empresa.
No caso da Braskem, o hedge
adotado evitou que o prejuízo líquido de R$ 128 milhões no segundo trimestre
fosse mais de oito vezes superior.
O prejuízo da petroquímica
teria chegado a R$ 1,082 bilhão no período, segundo a própria empresa.
O início da temporada de balanços
do segundo trimestre já indica que nos próximos meses outras companhias tendem
a usar a contabilidade de hedge. A mineradora Vale informou que estuda a adoção
da prática.
No entanto, o presidente da
Vale, Murilo Ferreira, declarou em teleconferência com analistas e investidores
que a empresa decidiu não usar a prática no segundo trimestre para não parecer
uma medida "casuística".
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