sexta-feira, 26 de julho de 2013

As limitadas podem emitir debêntures?


Extraído da Fenacon

Por Renzo Brandão Gotlib


Em 2012, duas juntas comerciais do Brasil discutiram sobre a possibilidade, ou não, das sociedades limitadas emitirem debêntures. A Junta Comercial de São Paulo (Jucesp) recebeu para inscrição as escrituras de debêntures por uma sociedade limitada, e a Junta Comercial do Rio de Janeiro (Jucerja) decidiu sobre o arquivamento de ata de assembleia de sócios que deliberava a emissão de debêntures. Em ambos os casos, os órgãos se negaram ao arquivamento, baseando-se no fato de que a emissão do título é possível apenas por sociedades anônimas.

Já no ano de 2009, a Instrução nº 476, editada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), aumentou o questionamento acerca do assunto. A instrução regula as ofertas públicas com esforços restritos que, além de dispensar o registro da oferta perante a autarquia, não limita sua abrangência a nenhum tipo societário. Anteriormente à sua publicação, a CVM realizou, em maio de 2008, audiência pública para discussão da instrução e, inclusive, sobre a limitação do escopo da emissão de valores mobiliários emitidos apenas por sociedades anônimas.

As opiniões dos presentes divergiram. Os favoráveis à limitação às sociedades anônimas afirmaram que a Lei das Sociedades Anônimas contempla uma série de regras com as quais os participantes do mercado e investidores em geral já estão acostumados. Já os contrários, defendiam que a exclusão impediria a maior parte das empresas brasileiras de tirar proveito do mecanismo de captação que se pretende criar com a Instrução nº 476, o que contraria a intenção da CVM de facilitar o acesso ao mercado de capitais.
A simples ausência de previsão legal expressa não inviabiliza a emissão de debêntures pelas sociedades limitadas

A CVM respondeu ao questionamento afirmando que não havia se convencido da necessidade de restringir a possibilidade de realizar ofertas públicas com esforços restritos a um ou mais tipos societários. Diante da resposta da CVM, não ficaria vedada a nenhum tipo societário a emissão dos títulos abrangidos pela Instrução nº 476.

Ainda, a autarquia foi questionada pelos presentes quanto ao seu poder de polícia sobre o emissor, o ofertante e seus respectivos administradores, na hipótese destes serem organizados sob forma de tipo societário diverso de sociedade anônima. Em resposta, a CVM respondeu que, tendo em vista que o artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei 6.385, de 1976, sujeita os emissores de valores mobiliários ali referidos, bem como seus administradores e controladores, à mesma disciplina prevista para as companhias abertas, de forma que a organização societária seria irrelevante para se verificar a competência da autarquia quanto à aplicação das penalidades cabíveis a ela.

Contudo, foi negado o arquivamento dos atos que deliberavam a emissão de debêntures. O plenário da Jucesp, em 26 de junho de 2012, expôs em sua decisão argumentos a favor e contra a emissão, mas decidiu não arquivar as escrituras da operação, sob o argumento da ausência de previsão legal da emissão pelo tipo societário e que há uma ausência de regulamentação pela CVM.

Já a Jucerja publicou o parecer do processo nº 07-2012/232000-0, datado de 28 de agosto de 2012, no qual se recusou a efetuar o arquivamento de ata que deliberava a emissão de debêntures, sob o argumento de que a Instrução nº 476 não teria autorizado a emissão de debêntures por sociedades limitadas, mas apenas a emissão de debêntures sem registro na CVM. Também arguiu que, ao prever a possibilidade de emissão de debêntures, a Lei das Sociedades Anônimas utilizou expressamente a expressão "companhia" e sua emissão iria contra a natureza da sociedade limitada.

Entretanto, a simples ausência de previsão legal expressa não inviabiliza a emissão de debêntures pelas sociedades limitadas, uma vez que também inexiste uma vedação expressa a tal operação.

Sabe-se, ainda, que no Brasil a maioria das sociedades é constituída sob a forma de sociedade limitada e, muitas delas, além de serem tão desenvolvidas quanto às sociedades por ações, possuem estrutura e capital suficiente para efetuar a emissão de debêntures. Além disso, esta seria uma forma menos burocrática e onerosa que tomar um empréstimo bancário para captar recursos, tendo em vista a flexibilidade do título, no qual se pode estipular as condições de sua emissão.

Apesar dos argumentos favoráveis à emissão de debêntures por sociedades limitadas, na prática, a insegurança jurídica impede que os interessados na emissão de debêntures por limitadas prossigam com a operação, pois esta poderia ser questionada, motivo pelo qual os participantes do mercado continuam optando pela emissão de debêntures apenas por sociedades anônimas, o que acarreta no aumento dos custos de emissão de debêntures e diminui e restringe o número dos participantes neste mercado. Assim, é necessário que haja consolidação do posicionamento pelos órgãos de registro de empresas, CVM e Judiciário ou ainda a regulamentação expressa sobre emissão de debêntures pelas sociedades limitadas para que o instrumento possa ser utilizado amplamente pelo referido tipo societário no Brasil.

Renzo Brandão Gotlib é advogado do Departamento Consultivo da Azevedo Sette Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte: Valor Econômico

Regra contábil vira o jogo para endividadas



Por Natalia Viri | De São Paulo


Um comunicado divulgado há duas semanas mudou drasticamente as perspectivas para o balanço da Petrobras. Da noite para o dia, as projeções de lucro no segundo trimestre subiram para R$ 5 bilhões, contra a expectativa anterior de que a empresa fechasse o período no zero a zero, sem lucro nem prejuízo.

O anúncio não dizia respeito a descoberta de uma super-reserva de petróleo, nem um aumento nos preços dos combustíveis. Tratava-se apenas de uma mudança nas regras contábeis adotadas pela companhia que, sozinha, tem o poder de tirar cerca de R$ 7 bilhões em perdas financeiras esperadas para o segundo trimestre.

Na quarta-feira, foi a vez da Braskem adotar o mesmo dispositivo da Petrobras. Numa tacada só, o J.P. Morgan revisou a perspectiva para as perdas da companhia no segundo trimestre, de R$ 1,2 bilhão para R$ 200 milhões e afirmou que a empresa vai começar a distribuir dividendos neste ano. A petroquímica é uma das coligadas da estatal, que tem uma participação de 36% no capital.

O "sumiço" repentino de uma cifra bilionária das demonstrações de resultados trouxe diversas críticas sobre o viés político da decisão. Com lucro maior no curto prazo, os dividendos também aumentam, beneficiando o governo, na posição de controlador da Petrobras, o que fez com que as palavras "manobra contábil" e "contabilidade criativa" se multiplicassem nos relatórios de análise de diversos bancos.

Mas apesar do efeito bastante conveniente para os acionistas no curto prazo, especialistas ouvidos pelo Valor garantem que não há nenhum passe de mágica ou truque na medida. O que a Petrobras fez foi adotar um dispositivo previsto pelo pronunciamento contábil 38 (CPC 38) e ainda pouco conhecido, que rege a chamada "contabilidade de hedge". O intuito é reduzir o sobe-e-desce na última linha do balanço e trazer um retrato mais claro da situação operacional da companhia nas demonstrações de resultados.

Petrobras e Braskem vão utilizar parte da variação cambial sobre sua dívida em moeda estrangeira como "proteção" para uma eventual queda do câmbio em uma fatia de suas receitas previstas com exportação. Sem a contabilidade de hedge, toda a dívida em moeda americana é corrigida pela cotação do dólar: a diferença é contabilizada como ganho ou perda financeira, ainda que a maior parte desse passivo vencerá apenas no longo prazo.
Com o mecanismo, a variação cambial sobre parte dessa dívida é "reservada" numa conta no patrimônio líquido e só passa para a demonstração de resultados quando a receita que serve como contrapartida é faturada. A Petrobras se inspirou na fabricante de alimentos BRF, única empresa de grande porte adotar o mecanismo que contrapõe dívidas a exportações no país. Segundo apurou o Valor , técnicos da estatal consultaram a equipe financeira da companhia para entender melhor o modelo.

O CPC 38 prevê diversas situações em que instrumentos de hedge podem contar com uma contabilização especial. Mas, na maioria dos casos, esses instrumentos envolvem derivativos. A única exceção, que permite a utilização de um não derivativo, é para a proteção de um risco cambial. "As empresas estão mais acostumadas a utilizar o CPC 38 para contabilizar derivativos. Poucas ainda sabem ou tem segurança para utilizar o dispositivo que autoriza o uso de dívida", afirma César Ramos, autor do livro "Derivativos, riscos e estratégias de hedge" e consultor de companhia que adotaram a prática, como a própria BRF.

Com o modelo, tanto Petrobras quanto Braskem se protegem de uma eventual queda do dólar sobre a receita com exportações. Na prática, o que as empresas fizeram foi "garantir" parte de sua receita operacional no câmbio de maio - quando o dólar Ptax estava próximo dos R$ 2 -, quando a operação foi designada.

Num exemplo hipotético (ver esquema ao lado), a empresa tem US$ 1 milhão em dívidas em dólar e US$ 1 milhão em receitas com exportação a ser faturadas. Se o câmbio for a R$ 1,50, o "ganho" de R$ 500 mil com a variação cambial sobre a dívida fica reservado no patrimônio líquido. Quando a exportação for faturada, caso o câmbio se mantenha nesse patamar, trará uma receita de R$ 1,5 milhão - menor que a esperada em maio, portanto. A variação cambial sobre a dívida, que estava reservada no patrimônio, no entanto, entra como um ganho na receita operacional, que, no fim das contas, fica em R$ 2 milhões - travada, portanto, no câmbio inicial de R$ 2.

Apesar da segurança de que parte da receita virá no câmbio esperado e da redução da instabilidade, a estratégia é mais bem-sucedida em termos de efeito no lucro no caso de queda no câmbio. Isso porque ambas as companhias também tem custos em dólar, que não estão envolvidos na operação.

Se o dólar cair, a receita ficará travada em R$ 2 milhões, enquanto os custos serão contabilizados com a moeda americana mais barata. O resultado é um número maior na última linha do balanço. Na contramão, no caso de alta do dólar, o lucro contábil tende a diminuir, já que os custos serão contabilizados por um câmbio maior do que parte da receita.
Em sua estratégia, a Petrobras utilizará 70% de sua dívida para proteger 20% de suas receitas com exportação dos próximos sete anos. Fontes consultadas pela reportagem afirmaram que, apesar de dentro da regra, o prazo é "ambicioso". "O normal é que as empresa tracem essa operação para um horizonte de seis meses até dois anos", disse um interlocutor. Ele reconhece, no entanto, que, com um horizonte maior para as exportações, é possível envolver uma parte maior da dívida na operação - o que tira uma fatia maior das perdas financeiras da demonstração de resultados e melhora o lucro. Procurada, a Petrobras não quis se pronunciar. A Braskem ainda não divulgou os percentuais envolvidos em sua estratégia.

Política de gestão de riscos fraca explica baixa utilização
A falta de uma política de gestão de riscos e controles internos adequados é o principal empecilho para uma adoção mais ampla da contabilidade de hedge no Brasil, afirmam especialistas. Apesar do benefício claro com a redução do "efeito sanfona" no lucro líquido, a utilização da norma ainda engatinha entre as empresas não financeiras.

Diversas companhias, inclusive a Braskem e a Petrobras, já adotam o mecanismo para
minimizar a oscilação causada por alguns derivativos que protegem contratos de câmbio, juros e commodities. Mas a utilização ainda é considerada tímida quando comparada com a Europa e os Estados Unidos.

"A contabilidade de hedge é opcional, mas a empresa não adota só porque quer. Pelas regras, é como se tivesse que fazer por merecer", afirma Fernando Galdi, professor da Fipecafi e da Fucape. A adoção da medida implica uma documentação rígida da estratégia adotada e dos riscos assumidos. E nem sempre as empresas tem rotinas preparadas para fazer frente à essa exigência.

Segundo o consultor César Ramos, na maior parte das vezes, há necessidade de estabelecimento de novas rotinas de controles internos - o que, em um implica em novos custos, que nem as companhias nem sempre estão dispostas a assumir. "O problema é que a maior parte das empresas ainda tem dificuldade em enxergar o retorno desse investimento", ressalta.

Desde a crise de 2008, quando diversas empresas tiveram perdas bilionárias com derivativos, o aprimoramento da gestão de riscos é considerado um ponto crucial para as companhias abertas brasileiras. "Hoje, muitas empresas se limitam a fazer uma descrição burocrática de como elas lidam com os riscos, apenas para atender aos itens que são exigidos nas divulgações por parte do regulador. A contabilidade de hedge exige que essa política seja mais pragmática e próxima das decisões práticas", explica Galdi, da Fipecafi.
Entre a longa documentação exigida pela contabilidade de hedge, está o estabelecimento de rotinas de avaliação de riscos e limites de exposição a determinados instrumentos financeiros, além de testes de eficácia da estratégia adotada, tanto de forma retroativa quanto de forma prospectiva. A empresa pode deixar de adotar a prática, mas tem de documentar para auditores e para o regulador que a decisão foi tomada olhando-se para a frente, e não ao sabor das oscilações do mercado.

Aos poucos, no entanto, o interesse pela medida tem aumentado. De acordo com Rogério Lopes Mota, sócio de auditoria da Deloitte, em momentos de maior instabilidade do mercado, como o atual, a demanda de clientes por esclarecimentos em relação à contabilidade de hedge cresce.

E a adoção mais agressiva por empresas de grande porte e visibilidade, como a Petrobras tende a colocar a prática nos holofotes. "Nossa experiência mostra que a adoção de práticas contábeis por empresas que tem mais visibilidade costuma ser uma espécie de guia para o mercado", diz o auditor.

Galdi, da Fipecafi, também afirma que a procura por seus cursos sobre o assunto tem crescido nos últimos anos e atraído um público mais diverso, para além das áreas de controladoria. Uma circular do Banco Central autorizou a contabilidade de hedge para instituições financeiras em 2002. Mas para as empresas não financeiras, a norma só passou a valer em 2009, dez anos após de ter chegado aos Estados Unidos. "Nos primeiros anos após a circular, pouquíssimas empresas a utilizavam. Hoje, a adesão entre bancos é comum. O mesmo tende a acontecer para empresas não financeiras", afirma.






quarta-feira, 24 de julho de 2013

HRT confirma preparação para venda de ativos


Fonte: Valor Econômico

A petroleira HRT confirmou há pouco ao mercado que está se preparando para um cenário de venda de ativos, conforme adiantou o Valor, na terça-feira. A afirmação foi feita em fato relevante, encaminhado em resposta a pedido de esclarecimentos feito pela BM&FBovespa, após publicação da reportagem no jornal.




Segundo o documento, o conselho de administração decidiu, por unanimidade, estabelecer um novo comitê especial para avaliar o que a companhia colocará como “possibilidades de desenvolvimento inorgânico” para a HRT.
As opções avaliadas incluem potencial venda de ativos, além de combinações estratégicas e fontes alternativas de captação, segundo a empresa. A HRT informou que esse comitê foi criado em 28 de junho e divulgado ao mercado em 1º de julho.
A HRT afirmou ainda que o comitê não fez afirmações para a matéria e que a companhia foi consultada pelo Valor e confirmou que está em processo de seleção de uma instituição financeira, sem mencionar quais instituições estão sendo avaliadas para assessorar o comitê especial.
O comitê especial é composto por Peter O’Brien, membro do conselho de administração, como presidente do comitê, François Moreau e Joseph Ash como membros efetivos e por Ricardo Bottas, diretor financeiro da companhia, que presta assistência ao comitê.
Na última sexta-feira, a companhia anunciou que um segundo poço perfurado na Namíbia, África, onde esperava encontrar petróleo, é seco. O primeiro também havia sido considerado não comercial. O cenário fez com que diversos bancos rebaixassem o preço-alvo das ações da companhia. Ainda está programada a perfuração de um terceiro poço na região.
No fato relevante, a HRT frisou que sua administração está concentrando esforços na atividade exploratória e no processo de transição e operação do Campo de Polvo, do qual a petroleira brasileira adquiriu 60% da britânica BP, em maio.
Diz também que concentra esforços na venda de ativos não associados diretamente à sua atividade principal, devolvendo recursos financeiros importantes para fortalecer a posição de caixa da companhia, sempre com o propósito de buscar maximizar o valor dos acionistas da HRT.