Com status de uma das profissões mais promissoras da atualidade, a
auditoria não para de se reinventar. Depois da adesão do Brasil às
Normas Internacionais de Contabilidade (International Financial
Reporting Standards - IFRS) e de Auditoria (International Standards on
Auditing - ISA), a luta dos auditores agora é para se manterem atentos
às novidades, aperfeiçoar o conteúdo do relatório e corresponder às
expectativas de um mercado cada vez mais exigente.
Em sua 4ª
edição, a Conferência Brasileira de Contabilidade e Auditoria
Independente, realizada nos dias 18 e 19 de agosto em São Paulo, buscou
debruçar-se sobre esses temas. A lotação do evento, promovido pelo
Instituto dos Auditores Independentes do Brasil (Ibracon) na capital
paulista, e a variedade de sotaques ouvidos deixavam clara a grande
procura por qualificação profissional de auditores de todo o País.
Se
“sem auditor independente não existe mercado de capitais”, como diz a
diretora da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) Ana Novaes, tampouco
pode se negar o aumento da responsabilidade ou da pressão sobre esse
profissional. Contudo, é preciso ficar claro que o auditor não pode ser
considerado responsável por potenciais fraudes ou inconsistências nas
demonstrações financeiras das organizações.
Caracterizado como um
“intermediário informacional entre a empresa de capital aberto e o
mercado de capitais” pelo professor da Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA/USP)
Nelson Carvalho, o auditor independente apenas avalia subjetivamente a
demonstração contábil. “Antes, acreditávamos em um engodo de que os
balanços eram um somatório de exatidões matemáticas. Porém, eles têm
apenas três coisas exatas: a data, o caixa e a quantidade de ações em
circulação”, garante Carvalho.
Embora a opinião do auditor seja um
dos fatores levados em conta na tomada de decisões dos investidores,
ele tem basicamente o compromisso de verificar se as demonstrações
financeiras da empresa estão conforme as normas. “Não podemos confundir o
trabalho da auditoria com o de uma empresa de seguros. O auditor não
toma decisões na empresa nem pela empresa. Ele se preocupa se o produto
das decisões está refletido nos balanços”, diz Carvalho.
O
advogado Luiz Leonardo Cantidiano, sócio no Motta, Fernandes Rocha
Advogados, lembra que a função do auditor independente está bem clara na
Resolução 2.206 do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e que, do
ponto de vista jurídico, não pode ser julgado culpado por práticas que
fogem à sua alçada. “Não há nada na legislação societária que estabeleça
responsabilidade solidária entre auditor e a administração da sociedade
financeira perante terceiros”, determinou o advogado, pontuando que o
auditor pode ser punido caso cometa erros no que lhe cabe.
Apesar
do aumento de funções, os casos de processos colocando em dúvida o
relatório do auditor continuam sendo raros. Dados da CVM apontam que dos
37 processos abertos pelo órgão nos últimos cinco anos, apenas 15 foram
levados a julgamento. Dos julgados, um resultou em suspensão do
desempenho da atividade por dois anos, dois foram absolvidos, e outros
12, multados.
Tendo em vista a complexidade ao avaliar um crime
envolvendo a figura do auditor independente, o promotor de Justiça de
Falências do Ministério do Público de São Paulo (MPSP), Eronides
Aparecido dos Santos, destacou que recentemente o Superior Tribunal de
Justiça (STJ) apontou como mais adequada uma via alternativa às
utilizadas - Subjetiva e Objetiva. A Responsabilidade Civil Subjetiva
com Presunção de Culpa dá ao auditor a possibilidade de “comprovar que a
conduta não foi culpável mantendo o incentivo a não ser negligente”.
Novo relatório destaca opinião de profissional
Contrariando
a máxima de que os contadores são indivíduos preocupados exclusivamente
com números, esses profissionais estão se envolvendo mais na gestão
empresarial e, no caso dos auditores, com as necessidades das empresas
contratantes e das instituições de crédito. Resultado disso, por
exemplo, são as recentes mudanças no Relatório de Auditoria. Mais direto
ao ponto, ele começará pelo campo opinativo e refletirá a valorização
do seu ponto de vista no mercado atual.
Até 2009, ano em que o
País adotou a Resolução 1.231/2009 do CFC – normas sobre os objetivos
gerais do auditor independente -, o relatório continha três parágrafos
bastante sucintos. Depois da sua implantação até agora, o relatório
passou a contar com mais elementos, entre eles Introdução, Relatório da
Administração, Relatório do Auditor e Opinião.
O Novo Relatório do
Auditor Independente, em fase avançada de discussão na International
Federation of Accountants (Ifac), propõe que se comece pela Opinião do
Auditor e a descrição do que foi examinado, com o detalhamento do que
serviu como base para a formação dos pareceres do profissional. Outra
grande novidade é a descrição dos assuntos-chave da auditoria, como, por
exemplo, áreas de risco significativo, áreas em que o auditor teve
dificuldade e circunstâncias que exigiam mudanças.
Segundo o
membro do International Auditing and Assurance Standards Board (IAASB) e
da Comissão Nacional de Normas Técnicas do Ibracon, Valdir Coscodai, os
auditores terão também que opinar sobre a capacidade de continuidade
operacional da empresa – o chamado going concern. “O Novo Relatório de
Auditoria manterá a natureza binária da opinião do auditor, contudo, o
mercado vem exigindo a complementação com descrições mais específicas”,
explica Coscodai.
O coordenador do Comitê de Normas de Auditoria
do Ibracon, Claudio Longo, adverte ainda que o relatório passará a
conter, obrigatoriamente, a identificação do responsável pelo documento,
ou seja, um dos sócios da firma de auditoria. “Para nós brasileiros,
esse não será um problema. Mas, em outros países, é comum que um
funcionário assine em nome da empresa”, conta Longo. As novas normas
devem ser finalizadas ainda em 2014. A previsão é que o processo de
implantação seja finalizado em 2016.
IASB traça cenário das IFRS para os próximos anos
As
Normas Internacionais de Contabilidade (IFRS, na sigla em inglês),
emitidas pelo Comitê Internacional de Contabilidade (IASB), constituem
uma fonte de referência para as práticas contábeis mundiais. Pelo fato
de representarem um conjunto de normas constantemente atualizadas com as
exigências do mercado mundial, elas têm sido adotadas, em diversos
países, como é o caso do Brasil.
As regras e rotinas se atualizam
em ritmo frenético. Para estar sempre de acordo com o prazo, o ideal é
acompanhar as novas formulações desde a concepção, participar de
audiências públicas e estudar os instrumentos antes mesmo de se tornarem
obrigatórios, buscando uma adequação gradativa dentro da firma de
auditoria.
Amaro Gomes, que integra o International Accounting
Standards Board (IASB), apresentou as novidades da entidade no que se
refere às IFRS. Entre os destaques, está a IFRS9, aplicável no Brasil a
partir de 2018 e que deve substituir o Instrumento Financeiro IAS 39.
Gomes lamentou a impossibilidade de as empresas optarem pela adoção
antecipada do novo instrumento e lançou o desafio de aplicar o IAS 39
tendo em vista o IFRS9, mais completo.
Além desta, o IFRS15 -
Revenue from Contracts with Customers (Receitas de Contratos com
Clientes, em tradução livre) está em fase de elaboração e inova ao
introduzir o conceito de controle sob a ótica do cliente. “Ele consolida
o que tínhamos no IFRS14 e deve afetar principalmente as empresas de
telefonia móvel”, explica o representante do IASB. O IFRS15 deve entrar
em vigor a partir de 2017.
A vice-presidente técnica do Conselho
Federal de Contabilidade (CFC), Veronica Souto Maior, destaca que os
auditores devem ir além de buscar adequar-se às novidades nas normas
publicadas pelo órgão internacional. Uma oportunidade está na atenção às
Pequenas e Médias Empresas (PMEs). “Alguns países do mundo adotaram as
normas apenas para companhias abertas. No entanto, o ambiente brasileiro
é diferente”.
O crescimento da valorização do auditor comprova
sua credibilidade no mercado nacional. A obrigatoriedade da educação
continuada e o ambiente competitivo contribuem para isso. Estar de
acordo com as normas internacionais em um País com uma estrutura
tributária complexa parece difícil. Mas, como diz o coordenador do
Comitê de Normas de Auditoria do Ibracon, Claudio Longo, “as discussões
sobre os métodos já passaram. O que é necessário fazer agora é pensar em
como cuidar dessas mudanças”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário